segunda-feira, 26 de abril de 2010

Pincelar é viver

Deve ser mesmo complicado ser técnico de futebol. Com tantas pressões, justas ou não, vindas de qualquer um dos lados para os quais você observe, restam ao polêmico personagem duas opções: tentar manter suas opiniões e posições pessoais, doa a quem doer, ou entrar na onda e virar o boneco Sinforoso de quem, supostamente, está acima dele na hierarquia do clube. Ricardo Gomes Raymundo, do SPFC, optou pela segunda: sem o menor constrangimento, sacou Washington, que, mesmo sem encher os olhos, vinha sendo o artilheiro do time na temporada, e promoveu Fernandinho a titular, mesmo que ambos não ocupem a mesma posição. "É, ele deve ter merecido", pode pensar aquele que possui inabalável boa vontade, e que acredita em um mundo de justiça, igualdade e democracia para todos. Como nós aqui somos o inverso amargo desse leitor ideal, preferimos acreditar que tudo não passa de uma jogada, tão comum na era dos "investidores", para tentar valorizar o guri. Pois vou explicar passo a passo: ele é oriundo do tal Barueri, não? É lá temos a tal "administração moderna", de gente que conhece números a valer, sabe fazer contas complicadas de cabeça e negocia como ninguém, não? E Fernandinho foi considerado, devido à escassez de quem valesse o título, a "revelação" do último Brasileiro, não? Ora, crianças, se encaixaram o moleque no SP, isso é porque existe promessa de lucro para todos os envolvidos, e que faz os olhinhos dos engravatados brilhar com cifrões, sua verdadeira representação de bem-estar e felicidade. Então, como é que um pusilânime como o Gomes deixa um diamante de tal quilate no banco? Eles, que só enxergam pilhas e pilhas de verdinhas, não conhecem futebol a ponto de ver que Fernandinho não sabe correr, passar a bola, driblar e chutar a gol. Mas sua pressão, feita de chantagens medrosas e choramingos covardes, no fim das contas deu resultado: o treineiro cedeu, e colocou a criatura para jogar, com pose de quem estava de fato acreditando na mentira. Exultantes, cartolas e empresários comemoram - aos que gostam do esporte, resta rir com a mediocridade do pseudo-craque e com o descaramento cada vez maior das operações quetais no mundo da bola.

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Enquanto a rede Globo arruma um amistoso patético entre Botafogo e Corinthians para tapar o buraco da transmissão dominical, pois o Cariocão acabara sem as finais (o Fogão deu um nó na emissora e em si mesmo, já que faturaria uma grana com direitos e transmissão e bilheteria das duas pelejas pelo troféu, coisa que clubes brasileiros se arrepiam e choram de pavor só de pensar em perder), a rede Record faz, em seu programa Domingo Espetacular, a enésima matéria para tentar justificar a obesidade de Ronaldo. Diz, com toda a condescendência que o jogador sempre tem direito, que ele passa por "problemas pessoais", que tem "fumado muito", e que é alvo de chacotas e galhofas até da imprensa estrangeira. Mensagem final: vamos ajudar o "Fenômeno" nesse momento difícil. Relevemos que ele ganha 1,5 milhão por mês e é "poupado" na maioria dos jogos, enquanto deveria ser o mais cobrado do elenco e ter condições de participar de, no mínimo, 5 partidas por dia. Vamos todos passar a mão na cabeça dele, com dozinha, mais uma vez, mesmo com sua vergonhosa falta de profissionalismo - afinal, todos o amam, né? Pensamento positivo, gente! Ele precisa de nós!

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Santo André e Santos fazem uma final de Paulista no Pacaembu. Nenhum dos dois joga em casa. O time do ABC abre as pernas para a imposição de quem quer que seja (redes de TV, adversário ou Federação Paulista), e faz lembrar o seu vizinho São Caetano, naquela final da tal "Copa João Havelange", que fez tudo o que o mestre (no caso, Eurico Miranda) mandou. Se agem com submissão e fazem de sua dignidade e de seus direitos algo pequeno, serão para sempre pequenos. Na Itália, o Milan perde para o rosado Palermo - e Ronaldo Gaúcho, que já era um cadáver de chuteiras, é, a cada nova partida, enterrado mais fundo. Vamos ver se alguém, além de revistas de fofocas que querem mostrar seu palacete em Milão ou comentaristas almofadinhas sem noção do ridículo, ainda se disporá a exumar esse putrefato defunto.

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Vícios (demais) e virtudes (de menos)

Deve-se dar o devido crédito à ESPN Brasil por exibir os grandes jogos da história das Copas. Sempre discuti com o Toro que esses canais a cabo deveriam OBRIGATORIAMENTE ter um programa que mostrasse gols antigos, aos moldes do antológico Gol - o Grande Momento do Futebol, de Alexandre Santos, porque o soccer, por incrível que pareça, crianças, possui uma história de bem mais de 100 anos. Sim, é verdade! Não foi criado com Ronaldo na década de 90, não! O maior craque já surgido no mundo não é David Beckham, por mais surreal que isso possa soar!

Mas os articulistas do canal são previsíveis em sua estupidez, e não poderiam deixar passar uma ocasião como a exibição de jogos "pré-históricos" sem demonstrar isso (e nossa função aqui é expor as entranhas e remexê-las - para ler elogios, procure um desses micos de circo por aí, muito fáceis de se encontrar em jornais, sites ou emissoras de TV). Primeiro, foi o tal Paulo Andrade - no meio do segundo tempo de Argentina x Holanda, em 78, ele me solta: "mas como eram estranhos os uniformes dessa época, não?". Esse é um ponto que dói aos admiradores do futebol moderno: as vestimentas antigas. Acostumados a esses uniformes feitos dos materiais mais avançados, padronizados de acordo com os campeonatos locais e coloridos de acordo com suas necessidades financeiras, eles chegam até a ter nojinho quando uma camisa mostra marcas de suor. Um comentário como esse, portanto, não serve para mostrar à audiência, com naturalizade, que os tempos mudam a maneira de se vestir de um atleta; mas sim para depreciar o antigo, torná-lo desagradável, e exaltar o que é vendido pelo canal agora - em especial os torneios europeus "lançadores de tendências" (coisa meio Ronaldo Ésper, não?). É o narrador buscando não adequar o nosso olhar, e sim em fazê-lo permanecer estranho àquilo que exibe - postura deveras cretina para um comunicador, mas facilmente explicável se o mesmo está ali para fazer a roda do comércio girar. Agora percebe-se o porquê de camisas antigas serem dadas como brinde em promoções de guaraná, e os modelos mais recentes, vendidos a peso de ouro em lojas de shopping.

Depois, na terça-feira, enquanto transmitiam Brasil x Itália, de 82, Antero Greco (um cara da escola de Celso Cardoso e Arnaldo Ribeiro, que somente repetem, sorrindo, o que o senso comum aponta) me sai com essa: "Essa seleção de 82 tinha um jogo muito mais bonito do que as de 94 e 2002, que foram campeãs". Opa, pera lá... Minha mãe, que não sabe NADA de futebol, falaria isso - e porquê? Porque tornou-se um clichê, um lugar-comum repetido desde aquele horroroso selecionado do Parreira ter sagrado-se tetracampeão do mundo há mais de 15 anos. Isso já foi repetido tantas vezes, e de forma tão automática e gratuita, que a própria frase deve bufar de enfado, toda vez que é novamente dita. Um analista deveria ir um pouco mais longe do que repisar esse terreno batido até mesmo por leigos, não? E algo já acontecido há tanto tempo sempre possui coisas diferentes ou mais atrativas para serem ditas, até por conta dessa distância que os anos impuseram. Mas a preguiça mental-verbal sempre fala mais alto. Ou melhor: a limitação do articulista, mesmo. Nem um mínimo que os faça abandonar o conforto do comodismo esses caras são capazes de oferecer. Preferem ser vistos como panacas do que como "agitadores". Melhor continuarem comentando os joguinhos de puro horror do Chelsea ou do Real Madrid, mesmo - parece até que já nasceram para isso.

(Para encerrar, uma confissão: eu gostaria de morrer antes da Copa 2014 no Brasil.)