segunda-feira, 29 de junho de 2015

Ele vai ficar com calos onde eu estava dizendo


Um dos mitos mais constrangedores criados para segurar a onda do futebol brasileiro pós-Ronaldo "Fenômeno" teve o próprio como protagonista: a tal "convulsão" na final da copa de 98. Uma balela ridícula que nunca se provou, mas que, graças a esse eterno telefone sem fio que é a mocoronga imprensa esportiva, virou verdade. Afinal, que conveniente é arrumar um surto ocorrido exatamente com o "principal jogador" (aspas aí pois era o principal para eles, nunca para nós) do time, ao mesmo tempo blindá-lo com uma historinha estapafúrdia e mostrar que ele é de "carne e osso", que todos podemos sucumbir em momentos de extrema pressão (jogador de ponta, tratado como "gênio", ter crise em final de mundial, o lugar no qual todos almejam estar? Vai vender bijuteria, cara!), e ao mesmo tempo resguardar todo o futebol brasuca, "não, não tem nada de errado", "foram os espasmos de Ronaldo que desestabilizaram o time, fora isso tá tudo bem"... A história já estava inteirinha pronta, seus desdobramentos eram perfeitamente plausíveis, bastava vendê-la - e esperar que fosse aceita. Para tanto, foi necessário mascar o cérebro da audiência até o ponto em que este ficasse inerte (vi inclusive uma história em quadrinhos com a "dramatização" do ocorrido), o que não exige grande esforço. Quase 20 anos depois, o conto da convulsão ainda está por aí e de vez em quando é repetido, porém, com as recentes papagaiadas da "nossa" seleção, perdeu um tanto de sua força mistificadora, já que a atual geração mostrou exaustivamente que o real problema a ser encarado é técnico, e não clínico.

Pois sim! O incrível Dunga, treinador opaco que cabe perfeitamente nessa seleção sem cara, e titular naquela final contra a França, tentou o golpe outra vez: na derrota para o Paraguai, que desclassificou o time da CBF dessa edição da Copa América, veio com um papinho de "virose", que 15 jogadores foram afetados, ficaram moles durante a semana e cheios de dorzinhas, mas ressaltou que isso não era "desculpa" e nem "atenuante" para a vergonha (como se a intenção de jogar o assunto na roda fosse outra). Já que não existem mais craques para vitimizar, afinal o único que poderia sê-lo farejou a roubada e deu um jeito de cair fora, agora a responsabilidade é pulverizada: para dar peso à história, é necessário incluir praticamente todo o elenco em vias de dar alguma plausibilidade ao rolê, de buscar alguma comoção, de permanecer arrogante e mau perdedor sem dar tanto na vista. Apelação e covardia à parte, o reflexo mais importante se deu na recepção às palavras do "professor": se aquelas que relatavam a tal "convulsão" serviram para unir o país em torno da mentira, de um auto-engano descarado, e assim, com um paliativo sem-vergonha, mascarar o péssimo futebol resultado da doentia valorização do carreirismo que tinha como principal artífice ele mesmo, o "convulsionado", dessa vez a lembrança do 7x1 não permitiu. Os vícios estão expostos como nunca; a bomba que em 98 já devia ter feito estragos profundos só agora espalha seus estilhaços. Virose? Gangrenou de vez, isso sim.

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