domingo, 11 de outubro de 2009

Um viva à corrupção

Uma vez, quando da transmissão de um jogo da seleção brasileira (provavelmente em uma Copa América, mas não me recordo qual), Luciano do Valle mostrou como as coisas são feitas na TV pós-Galvão Bueno. As imagens mostravam uma falta ou um lateral contrário ao Brasil, claríssimo, não apontado pelo árbitro, quando o solerte narrador disse: "e o o juiz não marcou... felizmente". Em pleno ar, ao vivo, sem o menor constrangimento, o popular "Bolacha" absolveu o apitador de seu erro, exatamente porque premiou a seleção de seu país. Mostrou, ali, em um lance que deveria passar despercebido, que podia ser conivente com um favorecimento ilícito (ou seja, com corrupção), e conclamou os que assistiam a fazer o mesmo - e estes, sob a ilusória bandeira do "patriotismo" a todo momento levantada pelo cronista, concordavam e aplaudiam, hipnotizados em suas casas. Não me esqueço dessa passagem porque pouca coisa pode ser tão reveladora da hipocrisia reinante nesse patético ufanismo que envolve a seleção brasileira - mas o que mais me marcou foi ver exposta, com tamanha clareza, a fragilidade da moral humana. Se o erro favorece a outra pessoa, não pode passar batido; se me envolve, já o recebo de bom grado, era a mensagem da "inocente" frase de Luciano. A mesma pessoa que reclama de um político corrupto ou dos desmandos da administração de seu condomínio ou do chefe no trabalho, por exemplo, é aquela que acha certo pisar em outra para subir de cargo ou que não acusa ter recebido um dinheiro a mais no seu contracheque, fim do mês. Dois pesos, duas medidas.

Lembro desse momento porque, ontem, o nosso querido apresentador atacou de novo. No jogo do campeonato sub-20, entre Brasil e Alemanha, ele disse que, "para nossa sorte", o melhor jogador germânico havia saído da partida, contundido. Outra vez, fez uso da filosofia "é a favor da gente, tá valendo" - e, dessa feita, até mesmo a eliminação de um adversário foi vista como algo acetável, se o que está em disputa é a "nossa" sobrevivência. Logo Luciano do Valle, o sujeito que, há um bom tempo atrás, tanto estimulava o fair-play no futebol, agora estimula o "olho por olho, dente por dente", à imagem e semelhança de seu belicoso colega global. Esse não é o papel de um narrador esportivo. A partir do momento que a pessoa passa a usar o microfone para vomitar recalques e preconceitos, com a máscara patriótica servindo de desculpa, deturpa-se por completo a sua função. Ele está lá para ser o mediador do público com o espetáculo, e não um incitador da tragédia e o pretenso porta-voz da honra, dos desejos e dos sentimentos de um país. Assim como os jogadores que lá estão, e a própria seleção como instituição, não nos representam, exatamente porque se construiu uma (proposital) distância abissal a separar o público das "estrelas", as débeis palavras dos nossos narradores, encastelados em seu cinismo e arrogância, não nos representam também.

Torcer contra a seleção canarinho: cada vez mais, uma questão de resistência.

3 comentários:

  1. Parabéns pelo blog cara ,é sempre bom mostrar que existe resistencia a esse futebol filha da puta de hoje em dia ! Abraços

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  2. nao pare bury! nao pare! dechavando a merda!!!!!!!

    morte ao futebol filhodaputa!

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  3. Cara, sob qualquer ponto de vista, os narradores esportivos de hoje são lamentáveis. Seja na torcida explícita, que enche o saco, seja na pessima qualidade da narração e da cobertura em si. Minha esposa costuma dizer que o futebol na TV seria melhor se tocasse música clássica no lugar dessas narrações absurdas.

    Abraços!!

    Fábio

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