sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Meu mundo sem futebol

Acordo. Muitas vezes, após um sono perturbado. Não posso pensar na bola. A realidade nua e crua bate à porta: a imperiosa necessidade de trabalhar, sobreviver neste Inferno. Em São Paulo, minha terra natal (que tanto amo e odeio), purgatório do bem e do mal, se encontra a infâme Babilônia – lar da exclusão e injustiça social, morada dos maiores preconceitos e afetos deste planeta. Após tomar a primeira de muitas doses de remédios que vou ingerir até o fim do dia, devo me conectar às linhas cibernéticas – até porque não encontro, de imediato, nada melhor para se fazer. Já passei do ponto de segurança de não me tornar um monstro ao combatê-los. Nem um inseto consegui me tornar – a frase de Marilene Felinto cada vez mais verdadeira e presente. Sinto-me fadigado, como se arrastasse em minhas costas uma rede lotada com toneladas de peso.
Nunca precisei do universo da música, cinema, escultura, pintura... tinha o futebol comigo, e nele havia tudo isso e muito mais. Sempre segui as tentações da vida com entusiasmo e coragem. Mas já é passado o tempo de me afastar deste vício de querer a pelota. É perigoso demais pra mim; catalisa o processo da fadiga. Devo escrever, então. Mas como o faço sempre com o coração em primeiro lugar, esta também se torna uma tarefa estafante. Exige-me lágrimas pesadas de
sangue, carreiras poéticas e figa apertada na canhota. Penso, penso e penso. Devo comer para me manter (minimamente) saudável. Tudo é caro, droga. Comer aqui custa muito dinheiro (trabalhemos, pois). Após invadir a internet, ela me rompe. O show do inútil e das notícias controladas diante de meus olhos. A mídia que serve de termômetro para esta sociedade domesticada até o talo. Para acalmá-la do caos, até mesmo dicas de como pintar as unhas vira notícia de destaque nos portais mais acessados e “respeitáveis”. O mundo se deixando levar
pelo oco. Volto ao dia-a-dia. Pouco me agrada no mundo artístico vigente, domado pelo tesão do auto-gozo e superficiais artifícios. Me arrependo, por um breve e dolorido instante, de não ter vivido qualquer outra manifestação artística com a mesma intensidade com que fiz com o futebol – ou ele teria feito isso comigo, e só ele poderia tê-lo feito? Acho que encontraria algo, sim, de meu agrado. Escondidas por aí, verdadeiras representações de arte ainda existem, sei disso. Mas não posso mais desfrutá-las, sem poder fazer com o número um em minha alma – é como um trêm perfeitamente funcionando e que de repente, perde a locomotiva. Chega! Agora, preciso pensar no trabalho. Pego às 13 horas e saio as 22. São duras, porém revigorantes horas. Fico longe das lágrimas na pressão da labuta, e só isso já bastaria para eu valorizar (e muito) aquele local. Mas como diria o pai de Kevin Arnold, “trabalho é trabalho”. Meu corpo pesa, dói em várias partes, por fora e por dentro. Moído pela fadiga física – que nunca vai ser tão intensa quanto a mental – penso muito no futebol. O problema sempre aparece se alguém quer falar de futebol comigo. Adoraria manter o mesmo padrão de alegria que eles, mas é impossível. A sombra
paira em mim desde 1996. Ela não me deixa em paz. Gera muito ataque nervoso e sinto, sempre, o dever de promover o anti futebol midiático que, inevitavelmente será (indireta ou diretamente) o assunto em questão. Sabem como é: cachorro mordido por cobra tem medo de lingüiça. Fim de expediente é hora de enfrentar a solidão do apartamento novamente. Tenho que comer mais um pouco, mas o estômago está doendo, apesar de ranger de fome. Sinto falta dos amigos,
do amor, da fiesta del fútbol! Mas não consigo mais enfrentar o caos do metrô, do transporte público paulistano. Engraçado que quanto mais propaganda otimista faz o Governo, pior, de fato, está o quadro que se tenta desenhar. Assim como no futebol moderno. Quanto mais os “narradores” gritam algo como “...é pura emoção, amigo!”, mas ela se faz ausente. Então fico comigo mesmo e o vazio do futebol e da vida. Tomo os últimos remédios: um pra dormir, outro pra não chorar, mais um pra cagar, outro pra respirar, pro psico, pro alento. E o melhor, e mais esperado, deles vem no último ato do dia, quando coloco no moderníssimo aparelho de DVD um jogo antigo qualquer – não me canso de nenhum deles! Em transe, começo a sonhar acordado. Ou teria vivido dormindo? Nem me importa. Mais um dia se foi, vencido, superado e a vida segue. Esse é o mundo de Deus, hombre! Passo longe de aceitar que minhas recentes lamúrias são sobre a vida, em primeira estância. Na derrocada é que deve-se viver seu ápice, diriam
Nietzsches, Hemingways e Seixas. É apenas a lamúria do futebol. Desse, eu já abri mão faz tempo. Boa noite.

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